FAPESP - Algumas Normas e Diretrizes do Programa de
Bolsas de Pós-Graduação (II)


Introdução

        Entre os fatores responsáveis pelo crescimento significativo do sistema de pesquisa brasileiro e, especialmente, do sistema de pesquisa paulista nas últimas décadas, deve-se conferir importância particular ao desenvolvimento dos programas de pós-graduação, em todas as áreas do conhecimento. Com efeito, praticamente todos os campos de pesquisa contam, hoje, com programas de mestrado e doutorado em instituições paulistas - programas capazes de propiciar a formação consistente de novos pesquisadores, condição necessária para o estabelecimento de um sistema de pesquisa sólido e constantemente aberto à renovação.
         Não há dúvida de que essa situação se deve, em grande parte, a agressiva política de bolsas praticada pelas agências federais de fomento, no âmbito nacional, e pela FAPESP, no âmbito de Estado de São Paulo. Especialmente nos últimos vinte anos, essa política contribuiu para tomar atraente para muitos jovens a opção pela qualificação formal e sistemática como pesquisador, o que permitiu a constituição progressiva da massa crítica indispensável à consolidação de qualquer estrutura sustentada de pesquisa.
         O crescimento dos programas de pós-graduação reflete-se claramente no crescimento acelerado, especialmente no decorrer das duas últimas décadas, do número de bolsas solicitadas e concedidas para a realização de cursos de pós-graduação no Brasil - fenômeno constatado por todas as principais agências nacionais.  No que concerne ao período 1995-2000, esse crescimento foi absorvido, no Estado de São Paulo, inteiramente pela FAPESP.  Enquanto o número de bolsas federais concedidas a estudantes de pós-graduação de instituições paulistas diminuiu, nesse período, em cerca de 15%, na FAPESP estavam em vigência, em 1995, 783 bolsas de pós-graduação; em 1998, 2616 bolsas; em julho de 1999, 5003 bolsas; no início de 2001, 6049 bolsas - quase oito vezes mais do que em 1995.  Uma análise mais detalhada dessa situação pode ser encontrada no documento O apoio da FAPESP à pós-graduação: evolução e perspectivas , disponível na página www.fapesp.br [http://www.fisio.icb.usp.br/posgraduacao/bolsas/fapesp_evolucaopg.html].
         Por um lado, esses números refletem uma modificação profunda da situação que originou a política de bolsas idealizada nos meados dos anos setenta. De fato, constata-se, hoje, que já é grande o número de programas bem implantados no Estado de São Paulo, com um fluxo de estudantes regular e crescente, em ritmo igual ou superior ao do crescimento do sistema geral de pesquisa.  Além disso, entre outros fatores, os bons resultados do importante investimento que a FAPESP, a exemplo das agências federais, vem fazendo em programas de iniciação científica permite esperar que um número crescente de estudantes venha a satisfazer critérios de desempenho mais rigorosos que os aplicados pelas agências até hoje. Em 1995, estavam em vigência, na FAPESP, 857 bolsas de Iniciação Científica; no início de 2001, esse número já era quase o dobro: 1609.  Parece evidente que isso deve conduzir à elevação progressiva do nível de exigência para a aplicação de recursos públicos na forma de bolsas de pós-graduação.
         Por outro lado, é inquestionável que as agências de fomento à pesquisa devem respeitar uma proporção adequada entre os recursos destinados a bolsas e aqueles destinados a financiar os custos materiais do desenvolvimento de projetos de pesquisa. A experiência nacional e internacional demonstra que o desequilíbrio nessa distribuição de recursos compromete o desenvolvimento saudável do sistema de pesquisa, a ponto de retirar-lhe as condições necessárias para a formação e a absorção adequadas de novos pesquisadores. No caso da FAPESP, essa proporção atingiu um ponto crítico. A consideração do volume da demanda altamente qualificada nos diversos programas de auxílio à pesquisa permite concluir que o aumento do percentual de investimento em bolsas só seria possível com prejuízo significativo para a capacidade de atendimento dessa demanda.
         Assim, não é necessário nem desejável que o crescimento do número de bolsas de pós-graduação acompanhe o crescimento da demanda total por essas bolsas.  Cabe substituir o estímulo à demanda em geral pelo estímulo demanda especialmente qualificada.  Mais do que quantitativo, ou seja, estimular o ingresso nos programas de pós-graduação, por meio da concessão de bolsas a um percentual significativo dos alunos de cada programa, o objetivo da política de bolsas hoje, no Estado de São Paulo, deve ser primordialmente seletivo - estimular a adoção, pelos estudantes, de padrões de desempenho que se definam como ótimos, respeitadas as peculiaridades das diferentes áreas do conhecimento.
         Trata-se de adequar o aumento do investimento público em bolsas de pós-graduação ao padrão viável de crescimento do investimento público no sistema geral de pesquisa. Se não acompanhado proporcionalmente por investimentos no sistema geral de pesquisa (no custeio direto da realização de projetos de pesquisa, na modernização de laboratórios e da infra-estrutura geral da pesquisa, bem como em todas as etapas da formação de novos pesquisadores, na forma de bolsas de iniciação científica, PD no Brasil e no exterior), o gasto com bolsas de PG pode revelar-se estéril.  Assim, o objetivo deve ser, hoje, o de encontrar, entre essas várias formas de investimento, uma proporção adequada para propiciar a expansão viável e equilibrada do sistema de pesquisa como um todo.
         Na prática, a passagem a uma política mais seletiva de concessão de bolsas de pós-graduação já vem acontecendo, na FAPESP, como consequência da competitividade crescente dos processos de avaliação. Além do aumento da demanda provocado pelo crescimento dos programas de pós-graduação do Estado, o número de solicitações também aumentou em virtude do estabelecimento, pela FAPESP, de valores para as mensalidades superiores aos fixados pelas demais agências, assim como da criação da reserva técnica associada as bolsas, destinada a prover os bolsistas de recursos materiais para custear o desenvolvimento de seus projetos de pesquisa.
         Levando em conta essa nova situação, a FAPESP iniciou um processo de reflexão e discussão, sobre novas formas de expressão institucional de sua política de bolsas de pós-graduação.  Esse processo convergiu no sentido do estabelecimento de algumas normas e diretrizes relativas à concessão e usufruto de tais bolsas.

  1. Deve-se priorizar o apoio, por meio de bolsas de pós-graduação, à realização de programas de formação que visem à confecção de teses de doutoramento, produtos de trabalhos de pesquisa originais e relativamente independentes, sob a responsabilidade de orientadores bem qualificados nas áreas em que se situem os temas dessas pesquisas.
  2. Esse apoio deverá beneficiar tipicamente estudantes que apresentem projetos de pesquisa avaliados como ótimos, revelem um potencial de desempenho ótimo e contem com a orientação de pesquisador com ótima qualificação no campo de pesquisa em questão.
  3. Na avaliação dos pedidos, os critérios deverão ser calibrados de maneira a que o volume de recursos empregados na linha de bolsas se mantenha num nível compatível com o crescimento equilibrado do investimento total da FAPESP no sistema paulista de pesquisa.
  4. Com base no que vêm evidenciando, nos últimos anos, os resultados do processo ordinário de avaliação dos bolsistas de pós-graduação da FAPESP, entende-se que, na maior parte dos campos de pesquisa, é viável que programas de formação sejam realizados, em nível ótimo, num período total de cinco anos.  Assim, essa deve ser a duração total ordinária das bolsas de pós-graduação usufruídas por um estudante.
  5. A questão da importância do mestrado no contexto do processo de formação de pesquisadores deve receber uma resposta não dogmática, e sim pragmática.  Por um lado, é bastante provável que haja situações em que seja útil que uma primeira etapa do processo de formação culmine com a feitura de uma dissertação de mestrado - por exemplo, situações em que, antes de aventurar-se numa pesquisa original, se julgue conveniente que o estudante realize um trabalho com menor grau de originalidade e independência, ou situações em que se planeje para o estudante um programa de formação sem continuidade temática perfeita. Por outro lado, a realização de programas de doutoramento direto deve ser considerada como uma maneira ordinária de qualificação dos pesquisadores, e não como algo justificável apenas em circunstâncias excepcionais.  Em suma, os programas de mestrado devem ser entendidos como etapas possíveis - e mesmo desejáveis, em muitos casos - mas não indispensáveis do processo de boa formação de pesquisadores.
Com base nessas considerações a FAPESP cria uma nova modalidade de bolsa e altera as condições de concessão de bolsas de pós-graduação.