Relatório do debate Pesquisa Básica X Pesquisa Aplicada

    O debate Pesquisa Básica X Pesquisa Aplicada, terceiro tema proposto pela disciplina “Debates atuais em Ciências Biomédicas” (BMB5805-1) do Programa de Pós-graduação em Fisiologia Humana, foi realizado dia 04 de maio as 17 horas, no salão Rosa do ICB IV.
    Os debatedores foram

Gerhard Malnic, professor titular do Departamento de Biofísica e Fisiologia do ICB, USP

e José Fernando Leme Magalhães, Diretor de Assuntos Estratégicos da Biolab e Diretor do Coinfar (Consórcio Farmacêutico Nacional). O Dr. Malnic foi convidado de última hora, em virtude do cancelamento por parte do debatedor originalmente convidado, Dr. César Timo-Iaria.
    Em um primeiro momento, o Dr. Malnic apresentou a evolução da ciência no Brasil, desde sua implantação, com a vinda da Família Imperial até os dias de hoje. O Museu Imperial foi fundado tão logo o Império Português se instalou no Rio de Janeiro na época em que o Brasil era apenas uma colônia. Esta vinda promoveu diversas mudanças ao país, que passa a ser sede do Império. Dona Leopoldina trouxe da Europa uma comitiva de letrados e cientistas, que em 1818 constituíram o Museu Imperial como primeira instituição de pesquisa básica, praticamente de descrição de flora e fauna. Em 1863 foi fundada a primeira biblioteca científica e mais tarde editada a primeira revista científica do país: Arquivos do Museu Imperial. Em 1880 foi montado o primeiro laboratório de fisiologia. Em 1808 foi fundada a primeira Faculdade de Medicina. Manguinhos (Instituto de Pesquisa em Saúde Pública) foi centro do primeiro núcleo de pesquisadores experimentais que voltavam seu interesse tanto para a pesquisa aplicada de vacinas e soros, dadas as epidemias da época, como para a pesquisa básica de fisiologia e farmacologia. Esta instituição formou diversos pesquisadores em ciência básica, como Osvaldo Cruz. O Instituto Butantã em São Paulo é outro que até hoje tem laboratórios de pesquisa básica e aplicada. O palestrante termina dizendo que as pessoas que criaram os institutos no século 19 tinham uma visão da necessidade de relacionar a ciência básica e a aplicada, formando um casamento de áreas que não se distinguem tanto, e que o importante é a ciência no todo.

    O Sr. José Fernando falou sobre o desenvolvimento de novos produtos. Assim, ele diferenciou pesquisa de desenvolvimento, dizendo que os institutos brasileiros têm alto nível de pesquisa, mas nem sempre os requisitos para o desenvolvimento de produtos. Para o desenvolvimento de produtos a indústria visa a inovação radical ou de incrementação. Esta inovação busca exclusividade, patentes, monopólio, diferencial, politicamente correto, e imagem institucional. A indústria investe dentro de suas possibilidades, encontrando dificuldades políticas junto aos órgãos controladores (ANVISA) e às universidades, para parcerias. O palestrante comenta a necessidade do sigilo durante o desenvolvimento de um produto, ao passo que a pesquisa visa a publicação. A gestão e o acompanhamento do projeto também são pontos diferenciais. Finaliza a exposição dizendo que não há um paralelo entre pesquisa aplicada e desenvolvimento, e que a indústria (farmacêutica) de forma alguma interfere na pesquisa básica.

    Após as duas apresentações foi aberta a sessão de perguntas do público, iniciando-se o debate, que de uma forma geral foi mais de esclarecimento de dúvidas em relação à indústria farmacêutica do que de polêmica do tema. O Sr. José Fernando respondeu sobre preços e margens de lucro das farmácias, uniformidade nacional dos preços de medicamentos. Falou que o relacionamento da indústria com a universidade é problemático, mas está dando seus primeiros passos, inclusive em relação à propriedade intelectual e gestão de projeto. Esclareceu, ainda, que não demora tanto quanto se pensa para patentear um produto. Ainda, disse que até 1950 a indústria farmacêutica brasileira produzia muito, mas que estes laboratórios (e suas pesquisas) foram comprados por multinacionais e está hoje aniquilada, tendo apenas cinco empresas que desenvolvem pesquisa. Salienta, ainda, que é mais barato e fácil comprar uma pesquisa pronta, mas que hoje não há produtos disponíveis como antes. Foi levantada a questão sobre a viabilidade de um projeto de mestrado ou doutorado ser vinculado à indústria. O Sr. José Fernando garantiu que existe esta possibilidade, uma vez que saída a patente o pesquisador pode publicar seus resultados. Houve a pergunta sobre o interesse da indústria farmacêutica para produtos específicos como para doenças raras e graves; a resposta foi de que isso gera produtos extremamente caros, e que a indústria investe sozinha no Brasil, diferentemente que nos EUA, por exemplo, que tem subsídios governamentais para estes casos. No Brasil, ainda há dificuldade de penetrância de medicamentos para a população, dada a monopolização do Estado para certos medicamentos, como para malária, tuberculose e administração de soros anti-ofídicos.